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quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Será o brasileiro solidário no câncer?


Publicado em: 10/09/2012 15:15:00
Será o brasileiro solidário no câncer?
Por Isabel Bressan
Nesta segunda semana de setembro será sancionada a Medida Provisória 553/2012. Festejada como medida de estímulo para a economia, dentro do programa econômico Brasil Maior, estabelece desonerações fiscais e da folha de pagamentos para diversos setores.
No embalo dessas medidas a Medida Provisória traz em seu artigo primeiro uma novidade para a Saúde: desconto no imposto de renda devido para pessoas físicas e jurídicas em troca de contribuição a entidades de saúde filantrópicas para aplicarem em ações de combate e prevenção ao câncer. Esses recursos poderão custear prestação de serviços médico-assistenciais para diagnóstico, tratamento, cuidados paliativos e reabilitação, formação de recursos humanos e pesquisas clínicas ou epidemiológicas.
Aí reside uma questão: ao inaugurar uma nova forma de custeio de assistência ao câncer por meio de recursos públicos de renúncia fiscal, a MP não condiciona que o acesso a esses serviços será universal e igualitário, por meio do SUS. Ela atribui ao Ministério da Saúde decidir que ações e serviços farão jus ao benefício.
Do modo como está, poderemos ver entidades como os hospitais filantrópicos Sírio Libanês e Albert Einstein recebendo recursos de empresas e pessoas físicas, advindos de recursos públicos de renúncia fiscal para aplicar no custeio de tratamento de câncer exclusivo para beneficiários de planos de saúde. Estaria aí inaugurada uma nova forma de subsídio público para o mercado de planos de saúde. Ou serão os doadores tão solidários a ponto de direcionarem seus impostos apenas para serviços com acesso universal e igualitário?
Aliás, subsídios públicos para tratamento de câncer por planos de saúde não são nenhuma novidade. Em abril último o Ministério da Saúde lançou um programa para aplicar de 505 milhões de reais no aumento de estruturas assistenciais de radioterapia e na compra de aceleradores lineares para o tratamento do câncer. Por meio da Portaria MS nº 931 instituiu o Plano de Expansão da Radioterapia no Sistema Único de Saúde, que irá criar ou expandir a capacidade assistencial em 80 hospitais.
O Plano de Expansão da Radioterapia no Sistema Único de Saúde não estabelece qualquer fonte de financiamento de custeio pelo SUS para os tratamentos que serão possibilitados pelo aumento da estrutura assistencial. Além disso, os critérios utilizados para a ordem de classificação e de prioridade dos hospitais interessados, embora tenham o mérito de priorizar entidades situadas em áreas com menor oferta de tratamento e de excluir empresas com fins lucrativos, não levam em conta o percentual de dedicação ao SUS de cada entidade.
Resultado: em torno de 60% dos hospitais escolhidos atendem por intermédio da SUS e de clientes de planos de saúde, muitos deles com planos privados de saúde próprios. Sem garantia de custeio adicional do SUS para os tratamentos, esses hospitais irão condicionar o acesso aos serviços ao pagamento de um plano de saúde por parte dos pacientes.
Não é para menos que o Plano de Saúde Santa Casa da cidade de Passos – MG com Registro ANS nº 3387-5 como Plano Filantrópico, que “detém 40% do mercado regional de planos de saúde” e a vantagem competitiva de manter uma “rede própria hospitalar de altíssima qualidade, pronta para oferecer recursos de tecnologia de ponta”, faz propaganda em sua página comercial da possibilidade de investimentos do Ministério da Saúde em seu hospital para instalação de Acelerador Linear para tratamento de câncer e de leitos de UTI.
Mas não reside aí uma novidade. As iniciativas públicas de alocação de equipamentos de radioterapia no Brasil, a partir dos anos de 1990, não garantiram aumento de recursos financeiros públicos de custeio pelo SUS para os serviços que seriam gerados com a maior oferta de equipamentos. Assim, de modo natural, a maioria dos equipamentos foi para regiões onde o sistema privado de saúde poderia custear sua utilização, em estabelecimentos de saúde de clientela compartilhada.
Desde então, a prática de instalação com dinheiro público de novos equipamentos de radioterapia em estabelecimentos de clientela compartilhada vem proporcionando o aumento da estrutura assistencial para o câncer disponível para o setor privado, deixando para a falta de custeio para o SUS o papel de limitar os gastos em saúde, em nome do equilíbrio das contas públicas, promovendo um estímulo à procura por planos de saúde com promoção do setor privado por meio de ações governamentais, bem ao estilo das antigas receitas de privatização do Banco Mundial.
Agora, para completar esse quadro, teremos com a Medida Provisória 553/2012 a novidade de custear com recursos públicos oriundos da renúncia fiscal a prestação de serviços médico-assistenciais para o combate ao câncer, exclusivos para quem paga plano de saúde?
Com a palavra, o Ministério da Saúde.

Aparecida Isabel Bressan é Médica Sanitarista, Mestre em Políticas Públicas de Saúde pela ENSP/FIOCRUZ e Diretora do CEBES.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

O Debate do Público e do privado no SUS: algumas considerações.


Meus alunos de medicina voltaram agora do EREM (Encontro Regional de Estudantes de Medicina), empolgados com o encontro e postaram no faceboock a satisfação em uma das palestras relacionadas com a "PRIVATIZAÇÃO". Por coincidência, no último dia 06/09 tivemos uma conversa instrutiva com o Prof. Dr° Tulio Franco que entre outros aspectos relacionados entre a relação do trabalhador com a humanização (falávamos de acolhimento, mas a discussão sempre permeia este aspecto) dizia sobre sua posição contrária a algumas formas de gestão da saúde sob o controle da iniciativa privada entre estas as Organizações Sociais  - OSCIP, OSS e as PPP(Parceria público-privada), mas foi enfático ao defender as Fundações Estatais de Direito Privado. Comprendi os argumentos do professor que se utiliza de uma experiência para demostrar sua aprovação aquele modelo.
E ai fiquei a me perguntar: também sou formador de opinião e conselheiros de saúde, estudantes, colegas e profissionais de outras áreas sempre estão o tempo todo sugerindo para mim a questão: afinal, isto é do bem ou do mal? 
Venho descobrindo que este debate maqueavélico é típico de quem quer nos manipular - ou pra um lado ou para o outro. 

Por um lado, a associação de que qualquer forma de gestão indireta da saúde com o termo PRIVATIZAÇÃO. Isto tem soado para mim como um engodo semântico, ideológico e ilegal . Semântico, por assim dizer, pois os interesses e a função pública dos serviços e ações não necessariamente se transformam nos modelos de gestão indireta, existem "n" exemplos entre os quais cito a Fundação Estatal de Saúde da Família daqui da Bahia, que por muitas vezes foi objeto de auditoria do qual inclusive estive fazendo parte enquanto auditor, ou ainda o Hospital de Clínicas de Porto Alegre e que demonstram efeciência e acesso de serviços e ações de antureza pública e gratuita. Engodo Ideológico, não é de agora, que este debate se trava como forma não só de disputa de poder institucional (o que pode ser considerado natural ao processo democrático) mas, principalmente como forma de coptação de atores para, primeiro movimentos sociais e, depois, destes para os partidos políticos (de quem está situação ou oposição). O PMDB/PSDB em São Paulo defende as OSCIP aqui em Vitória da Conquista são contra a Fundação Estatal do Esaú Matos, enquanto que o PT/PC do B se posicionaram contrários ao PAS de Maluf e aqui na Bahia defende OSS, OSCIP. Engodo ilegal por que as campanhas publicitárias de um lado ou de outro não traz no cerne da discussão a quem interessa o caminho que tomamos ou não  quando se trata deste assunto.

Por outro lado, quem defende a mudança da gestão direta de serviços e de saúde não responde (ou responde parcialmente) às questões fundamentais como: Por que agora - antes você (gestor) era contrário e agora é a favor? Ou ainda, o mesmo arcabouço jurídico do direito público se aplica quando se trata de organizações de direito privado, por exemplo lei de licitações, ou de quem é a responsabilidade pelo dano causado ao usuário (do Estado ou do parceiro)? - este ainda é um debate incipiente e que gera insegurança jurídica ao público e ao privado. E mais, quais as metodologias de controle interno e externo são capazes de evitar e capturar precocemente desmandos e fraudes (sim, pois as instâncias como conselho curador ou os mecanismos de metas quantitativas e indicadores de qualidade/acesso por si só já se mostram insuficientes com tem experiências de que elas podem ser facilmente burladas - eu sou testemunha disto!). Quem regula os atos e a produção de saúde diante da autonomia imanente desta atividade, ou será que os profissionais serão submetidos aos protocolos rígidos de conduta e burocracias mesmo quando o melhor para o paciente não é o que está normatizado para atender ao interesse do contrante de reduzir custo? Por que os serviços contratados pelo SUS dizem que esta não é uma atividade lucrativa, que os procedimentos são mal remunerados etc e tal mas mantem os convênios com os sistema e/ou querem se constituir em grupos para a ssumir a gestão de serviços de saúde?

É um debate com muitas perguntas e que me leva a ainda continuar filosofando: - Será que o SUS ainda não é um sistema totalmente público e ainda único. Digo isto, pois 54% dos serviços do SUS (DATASUS-2012) são vinculados ao setor privado, quando este deveria ser complementar. E não é, e nem sei se será único, se considerarmos a diversidade da realidade social, política, econômica do Brasil. Logo, a minha prudência até o momento sinaliza para a necessidade de DISCUSSÃO LOCAL, DICUSSÃO PARTICULARIZADA, ESTUDO DE CASO, não podemos formar opinião se não mergulharmos no debate que se faz na hora que surge ou se consolida uma proposta de mudança de gestão. De modo genérico, poderia dizer sou contrário a qualquer forma que privatiza e terceiriza a saúde, mas não posso deixar de considerar que a luta, o caminho pode ser muito mais interessante. Principalmente, quando vivenciei a realidade como funcionário do Hospital Esaú Matos, um exemplo de qualidade da atenção, mas também de amarras burocráticas, de vínculos precários de trabalho, de capacidade reduzida de expansão por dificuldades de contratação de pessoal ou entraves de compras. E a necessidade de expandir a rede primária, pois a Lei de Responsabilidade Fiscal impõe as amarras com limite de funcionalismo? Assim sou a favor da Fundação. Porém,  o estudo de caso do Esaú é mais interessante pois, como num paradoxo o Hospital Esaú Matos -  organização com excelentes resultados precisa mudar de forma de gestão?

Meu pé atrás justifica-se: Como numa instituição (o Esaú Matos ou o próprio Estado brasileiro em seus três níveis) sem cultura de controle e sem política de recurso humano definida pode garantir mecanismos de regulação/avaliação/controle (e aqui to falando de metodologias e não apenas de instâncias de controle)? Como garantir que organizações - como o Esaú Matos - não se tornem estruturas dicotômicas administrativamente do tipo: alto clero (definindo e recebendo distoantes remunerações, pois é ai que é o foco de interesse de quem assume a gestão destes serviços) para exercer mecanismos de controle de resultado e produção sobre o trabalhador (baixo clero). Sim, pois na Bahia infelizmente o processo de produção de experiências baseadas na CO-GESTÃO não sequer dá sinais de que existem nos moldes do que é proposto pela Política Nacional de Humanização com a chamada gestão participativa, com eleição de cargos de direção, com a formação e efetivação dos órgãos colegiados - como órgãos deliberativos nas instâncias internas destas instituições, onde nem mesmo uma comissão de ética é atuante. Por que acreditar numa proposta onde o conjunto de trabalhadores não participam de um amplo processo interno de discussão sobre os detalhes relacionados aos termos do contrato que formalizaram a Fundação? Assim, sou contrário a Fundação.
O que estou querendo dizer é que o debate é cotidiano e tem que ser intesamente transparente e participativo e não pode ser formato pelo nosso pensamento ideológico momentâneo (estou ou não no lado de A ou B), pois o patrimônio desta luta é a vida que defendemos como um bem precioso. Se for pra ser fundação que produza as relações de trabalho e atos de saúde justos e solidários com uma vida digna para todos (gestores, trabalhadores e comunidade) eu sou a FAVOR, caso o contrário, sou radicalmente do CONTRA.

Alexsandro Nascimento Costa.